Do ‘cérebro eletrônico’ à linguagem de programação Lua e criação do middleware Ginga, o Departamento de Informática marca gerações na indústria tecnológica com pioneirismo e liderança acadêmica, desde a década de 1960. Hoje, a qualidade do núcleo se compara a centros renomados por todo o globo
Em 1960, a Universidade foi escolhida para receber o primeiro computador instalado no Brasil e o primeiro para uso acadêmico em toda América Latina. A máquina, um Burroughs 205 batizado de “cérebro eletrônico”, foi inaugurada junto do Centro de Processamento de Dados e reforçou, na época, o avanço tecnológico da Universidade. Assim começava a ser desenhada a trajetória do Departamento de Informática, chamado carinhosamente de DI pelos conhecidos, que tem 52 de fundação.
Em 1999, o Rio Datacentro (RDC), com uma economia de R$250 mil por ano, já oferecia 72 computadores para os alunos. O diretor do DI, professor Markus Endler, afirma que a biografia do departamento está ligada à história da computação no Brasil, por ser responsável pela formação da maior parte dos profissionais da área no país. A proporção de professores de outras universidades com passagem pela PUC-Rio é grande, segundo ele, e, por isto, o trabalho realizado pela Universidade é respeitado por todos os profissionais brasileiros da área de computação. Endler também ressalta que o DI é, e sempre foi, conhecido nacional e internacionalmente pela excelência em pesquisa, educação e projetos.
– Em termos da qualidade de ensino e pesquisa, a PUC-Rio não deixa nada a desejar para os centros das universidades mais renomadas dos EUA e da Europa, como MIT, Stanford, Berkeley. Muitos de nossos ex-alunos hoje trabalham em grandes empresas de tecnologia, como Google, Amazon e Netflix. Isto é reflexo da excelente qualidade da nossa formação.
Antecessor de Endler na diretoria do DI, o professor Hugo Fuks faz questão de ressaltar a importância da figura do professor Carlos José Pereira de Lucena, um dos profissionais que trabalhou com o “cérebro eletrônico” na década de 1960. Fuks destaca que a atuação de Lucena em estimular o espírito de equipe no Departamento de Informática, com a convicção de que o corpo de professores é um grupo e precisa estabelecer um bom relacionamento interno.
– O Lucena é uma figura chave deste departamento, talvez destes 80 anos da PUC-Rio. A ideia do grupo é muito importante por causa do Lucena, foi ele que fez deste um lugar saudável para se trabalhar. Todo mundo tem que conversar aqui dentro, todo mundo tem que se entender.
Outro ponto prezado pelo DI é o intercâmbio acadêmico. Em 1988 houve um recebimento de US$400 mil em equipamentos para, na época, o Laboratório de Processamento de Imagem e para troca de conhecimento entre professores e alunos da Informática da PUC-Rio e de instituições do Japão. A proposta do convênio era que, ao final de três anos, três professores e seis alunos brasileiros fossem ao Japão e, em contrapartida, o mesmo número de docentes e discentes japoneses visitassem a PUC-Rio.
Pesquisa de Excelência
Para o professor Markus Endler, a inovação está no DNA do Departamento de Informática, que, para ele, “nasceu para fazer pesquisa”. Não à toa, o mestrado, que teve início em 1968, é considerado um programa de excelência internacionalmente e recebe nota máxima 7, da CAPES desde a criação da agência, em 2004. Da mesma forma, o doutorado, instituído em 1975, também é avaliado com conceito CAPES 7.
Endler explica que o trabalho realizado na PUC-Rio é um equilíbrio composto por teoria e prática que visa à criação e desenvolvimento de novos projetos. Como exemplo deste caráter empreendedor, Endler cita a linguagem de programação Lua e a participação para o surgimento do Instituto TecGraf.
A Lua é uma linguagem de programação desenvolvida na PUC-Rio e bastante usada pela indústria dos videogames e dispositivos embarcados. Fuks lembra que muitos jogos optam por utilizar a Lua por conta de sua qualidade, e ele considera a linguagem o maior sucesso tecnológico de uma universidade brasileira. A linguagem surgiu em um dos Núcleos de Inovação Tecnológica (NITs) do DI, o LabLua. Os núcleos oferecem diversos laboratórios com diferentes propostas, e os alunos têm a oportunidade de se integrar com inovações no campo da aprendizagem. Alguns dos jogos que usam Lua são Angry Birds, Counter-Strike Online, Grand Chase, Lego Universe, Street Fighter IV e World of Warcraft.
– Se você pesquisar os jogos que usam Lua no Google, você fica impressionado com a quantidade. Particularmente, eu acho que Lua é a maior contribuição que a PUC-Rio já deu em termos de tecnologia para o Brasil e para o mundo.
Outro produto mundialmente conhecido do DI, como assinala Endler, é o middleware Ginga. Desde 2010, o subsistema é considerado padrão nipo-brasileiro de TV Digital, e com softwares executados em toda smart TV moderna. Hoje, um dos laboratórios dos NITs tem o foco no estudo de Telemídia.
TecGraf
Criado há 33 anos, o Instituto TecGraf de Desenvolvimento de Software Técnico-Científico, é fruto de uma associação entre a PUC-Rio e a Petrobras. O diretor do TecGraf, professor Marcelo Gattass, esclarece que o objetivo inicial era manter o desenvolvimento tecnológico da Universidade com o financiamento da empresa parceira. Surgiu como uma iniciativa compartilhada entre os departamentos de Informática, Engenharia Civil e Matemática, mas posteriormente passou a integrar o DI como laboratório até se tornar instituto, em 2013.
Nas palavras de Gattass, o TecGraf é hoje um modelo único para pesquisa tecnológica autosustentada na Universidade. Segundo o professor, a PUC-Rio só consegue alcançar o nível de excelência em tecnologia por ter institutos como o TecGraf. O centro é financiado pela indústria, um grande diferencial na perspectiva do diretor. Para ele, o grupo é de natureza multidisciplinar que tem como missão utilizar o conhecimento acadêmico para o desenvolvimento de soluções para questões presentes na sociedade.
– Tudo são programas, por isso que eu digo que nossas soluções envolvem softwares, a gente faz um software que ajuda a resolver os problemas que existem. Nós temos soluções diversas, fizemos um sistema que acopla, com imagens de ultrassonografia, e imprime em 3D o modelo do bebê para a mãe cega poder observar. Outro sistema desenvolvido permite ver se um jogador de futebol estava impedido ou não em campo.
A versatilidade do TecGraf e a noção do papel colaborativo que uma instituição de ensino superior como a PUC-Rio deve ter com a sociedade levaram o TecGraf a se associar ao Instituto Tecnológico (ITUC) na luta contra o novo coronavírus. Os dois setores estabeleceram uma linha de produção de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) e que foram doados a hospitais do Rio de Janeiro.
A próxima geração de profissionais
Com tecnologias cada vez mais desenvolvidas, a informática passou a estar conectada com outros campos do conhecimento. Além da era do digital, vive-se a era da multidisciplinaridade. Fuks explica que a relação entre o indivíduo e a sociedade é, agora, mediada pela computação, por isso, acredita que o código de programação é “a língua franca do século 21”. Como aponta o professor, todas as áreas do conhecimento hoje são afetadas pela computação, que é completamente disruptiva. Para ele, há a necessidade de se preparar os futuros profissionais para atuarem nos novos tempos.
– O mundo é complexo demais. Temos que ter conhecimentos interdisciplinares, temos que saber ouvir o outro, temos que saber nos expressar, coisas todas que infelizmente são chamadas de soft skills, consideradas não tão importantes.
Hugo Fuks
A opinião é compartilhada pelo professor Markus Endler, atual diretor do DI, que acrescenta que a característica multidisciplinar é um dos pontos a serem aprofundados pelo departamento no futuro, e enfatiza ser necessário dialogar com a sociedade e as outras formas de conhecimento, algo proveitoso para todos. Segundo ele, o outro objetivo do DI é o fortalecimento de parcerias interdisciplinares fortes, atuais ou futuras, com empresas e universidades de renome, de forma que projete o DI para todo o mundo.
Para os próximos 80 anos da PUC-Rio, Fuks espera a valorização da graduação e do corpo de professores. Ele lembra que o ideal é equilibrar os dois lados da moeda, a pós-graduação, com pesquisas e estudos mais aprofundados, e a graduação, o início fundamental tanto para um caminho profissional no mercado ou na própria academia. Fuks define a graduação como um espaço de experimentação “incrível” para criatividade, inovação e interdisciplinaridade.